euvg Arquitectura 2008/2009: atelier V, atelier VI, atelier VII, atelier VIII; Pedro Machado Costa, Pedro Cordeiro

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A Viagem de Daniel Santos

Lisbon (Short) Story de Daniel Santos apresenta-se como um trabalho de grande rigor científico, sem que para tal se perca a informalidade própria de um registo como é o de um Livro de Viagem.
A organização do Paper é exemplar, referindo primeiramente a metodologia de abordagem ao problema colocado pelo enunciado do exercício, que depois irá estruturar os vários capítulos, onde o Aluno disserta sobre os conteúdos observados, munindo-se de bibliografia de apoios, mas também de uma visão pessoal, e crítica, que lhe permite ter uma leitura abrangente sobre o(s) objectos(s) de estudo.
O trabalho dispensa referências directas a informações anteriormente obtidas, quer nas Aulas de Atelier, quer através dos blogs; partindo antes de uma investigação inicial que irá possibilita uma eficaz leitura das obras vistas na exposição de Peter Zumthor.
Se tal facto é, por si só significativo, constata-se ainda assim que o confronto de Daniel Santos com as várias peças patentes na Lx Factory lhe terá permitido retirar conclusões que não são suportáveis apenas pela Bibliografia consultada. Exemplo disso é a identificação de pormenores construtivos com origem em conceitos e/ou vontades de projecto: “o funcionamento do vidro fosco disposto na fachada [do Kunsthal Bregenz]. Este refracta a luz horizontalmente que embate no tecto de vidro” (p.6). Esta observação, entre outras, revela-nos um modo francamente disciplinar de olhar para a exposição, de a interpretar á luz da cultura arquitectónica, e de a racionalizar no contexto dos interesses e sensibilidades próprios do Aluno.
Note-se também a capacidade inerente ao Aluno de relacionar a informação adquirida com outros exercícios por ele realizados (p.7); ou, num outro sentido, a correlação de experiências aparentemente diversas: “senti o mesmo que sinto quanto entro numa igreja gótica” (p. 12).
A selecção que Daniel faz dos elementos que considera mais significativos (da exposição) é notória, não só pelos critérios que demonstra, mas sobretudo pela forma de os suportar a nível teórico, revelando especial maturidade na leitura do objecto arquitectónico, e na capacidade de interpretação de códigos formais e materiais complexos.
Esse sentido é amplamente confirmado no Capítulo Terceiro, onde o Aluno visita, descreve, e (sobretudo) critica (por vezes de forma instintiva) várias obras de arquitectura. Partindo de algumas ideias de Zumthor relativas ao modo de perceber a natureza do edificado, Daniel faz uma leitura individual dos vários edifícios e/ou espaços onde deambula, retirando conclusões próprias. Frases como “é impossível avistar os limites da obra arquitectónica, não sabendo, dessa forma, onde acaba o edifício e começa o jardim” ou “o seu interior de madeira e com o betão armado á vista, com a marcação das cofragens de madeira, unifica-se num só” (p. 11) são exemplo disso; revelando-nos ainda a capacidade que o aluno demonstra em ler os edifícios, quer na sua espacialidade, quer na sua materialidade, concluído acerca dos conceitos que daí emergem: “todo o edificado, juntamente com o jardim, torna-se intemporal e são os dois, em conjunto, que podem reflectir serenidade e sedução” (idem), ou “[a igreja do Sagrado Coração] torna qualquer pessoa mais pequena”, ou ainda “vitrais (…) em pontos estratégicos” (ibidem).
Não concordando com o Aluno em algumas das suas observações (ex: “a estrutura […] pareceu ter uma estrutura demasiado rebuscada” (p. 13), ou “o interior [da Mexicana] não é uno, muito menos o corpo arquitectural” (p.19); o trabalho pauta-se sempre por um exercício de liberdade interpretativa; sempre informada, e sempre comunicativa; factores esses que são os exigíveis a um arquitecto; tornando dessa forma a qualidade do Paper inquestionável.
Vale ainda a pena fazer referências a alguns aspectos constantes no trabalho, tais como: a introdução de pequenas (e úteis) referências históricas (como é o caso do Ritz, ou da Igreja de S. Domingos), a descrição livre e descomplexada de aspectos menos relevantes (a Casa do Alentejo), e a citação de outras obras não referidas no enunciado do exercício.
O tipo de apresentação do trabalho aproxima-o de um registo eminentemente científico, revelando objectividade e clareza estrutural.
A Bibliografia é rica, abrangendo o leque de informação necessária á realização da investigação.
Em resumo; estamos em presença de um excelente exemplo do que é um trabalho científico, que reúne informação útil, a transmite de forma clara e inusitada, complementando-a com a própria natureza crítica do Aluno; que é fonte de enriquecimento da leitura que dele podemos extrair.
Aspectos a rever passam pela numeração das págs. (inexistente); e, mais significativo, pela necessidade de o Aluno adquirir um pouco de humildade intelectual na análise que faz dos fenómenos, contrariando algum do seu arrivismo natural.
Porque nem tudo se resume àquilo que as (naturais) limitações de Daniel o deixam perceber.

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Leituras do Mês

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Eládio Dieste

A obra do Uruguaio Eladio Dieste (1917-2000) entre a década de 50 e o final do séc., numa edição de luxo da Electa. O livro fica a cargo de Mercedes Daguerre, e tem textos de Mario Chirino, de Graciela Silvestri e do próprio Dieste: senza la rivelazione del mistero del mondo che viene dall'arte non faremo mai della nostra vita qualcosa di realmente umano.

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Obradoiro

O regresso de uma das publicações mais significativas do final da década de 80 / principios de 90, em Espanha e Portugal. Publicado pelo Colexio Oficial de Arquitectos de Galicia, e sob a Direcção de Carlos Pita, o número 33 de Obradoiro dedica-se ao Pequeno. Destaque-se o texto e Óscas Tenreiro (o Legado de Firminy), e os projectos de Solano Benítez e de César Portela.

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